quinta-feira, outubro 13, 2011

O Narcisismo Enquanto Antítese do Amor


            No ocidente temos enquanto parâmetro romântico o mito de que amamos outrem para experimentar a completude. De que completude estamos falando afinal? É um completar a partir de outro ou um completar de si mesmo? O que estamos buscando quando nos relacionamos?

            Por muito tempo estive buscando a experiência de sentir-me completa. Por definição esta busca se mostra inglória. Inglória, porque esta completude estática e perfeita simplesmente não existe. Não há sequer um dia que uma pessoa normal não esteja questionando suas próprias crenças, que não esteja perdendo ou recuperando a fé em algo.

Pensar é movimento, o que leva à conseqüência de que um estado de perfeição é também um estado de aprisionamento fora de todo pensamento.

        Mas a busca por completude não se encerra sob nossa própria pele. Precisamos construí-la externamente, moldar no outro nossa própria imagem melhorada. Até aí, nenhuma complicação. Mas o outro também deseja a completude tão ou ainda mais ardentemente e nesta inevitável tensão, o relacionamento acaba.

            Mas a relação acaba justamente por não ter existido uma composição de dois, mas uma justaposição de dois egos que buscam afirmação. Se por outro alguém tentamos preencher um vazio pessoal a partir de uma projeção, como pode haver um encontro? Não há encontro, mas desencontros aos montes.

            Não parece cruel este movimento de completar-se narcisicamente ao relacionar-se?

            Completar-se a partir de outra pessoa e nesta projetar um ideal de si mesmo não pode se entendido enquanto amor a outrem, mas a si mesmo, entretanto é um amor narcísico que não se efetiva, pois carrega em si a inevitável desilusão imposta pelas demandas do outro. A única maneira de esta "maracutaia" dar certo é anulando a vontade do outro, o que não é de forma alguma incomum, uma vez que muitas pessoas se sujeitam a isto voluntariamente.

            Mas pode o amor dar-se a outro? Podemos amar alguém além de nós mesmos, ou melhor, podemos amar alguém além de nós mesmos sem que isso signifique uma sujeição?

            Sim, mas implica um movimento difícil. Se estivermos sujeitados, dominados pelo registro da falta isso jamais será possível.

            O amor não pode ser regido pela falta, ou do contrário será sempre amor de si mesmo. Talvez a pista derradeira para começarmos a amar parta de uma solidão, de um cessar deste círculo vicioso narcísico.

            Enxergar a si mesmo para enxergar o outro, ao invés de enxergar-se no outro ou desejá-lo pelo que vos falta.

            A partir do momento em que enxergamos o outro completamente, podemos amar ou não o que encontramos. Para amar é preciso encontrar e este encontro precisa ser tão potente que jamais se esgote.

            Quebrar o aprisionamento na falta é desafiador, mas precisamos começar a tentar escrever amor não mais como antítese de liberdade.

                                                                                                                                                                                                            

Um comentário:

Luís Munaro disse...

E o indivíduo, "objeto de amor", pode configurar em si mesmo uma totalidade? Ou o que se chama totalidade extravasa as fronteiras do ego de um outro indivíduo, podendo-se ver refletida numa porção deles, todos igualmente passíveis de serem "objeto do amor"?
O que eu quero dizer, e que me deixa confuso: essa desconstução do amor egóico que consiste em renúncia ou complementaridade, não implica levar a compreensão do indivíduo para além da mônada? Quem se une a uma outra criatura não deixa de amar uma infinidade de outras criaturas. A distinção desse amor votado a um e a outro reside no seu aspecto sexual?
Seu texto me inspira a pensar e mesmo a imaginar se eu já amei algum dia.